20 de dezembro de 2007

Manifesto Meu (Maria de Maria)

"Manifesto Meu" a respeito dos resultados da Lei Municipal de Incentivo a Cultura, divulgados no Diário Oficial de quinta-feira dia 13/12/2007.

Este Manifesto não se trata das dores de quem não teve um projeto aprovado, até porque não fui proponente, mas pretende ser um questionamento da realidade cultural de Uberlândia, da qual todos fazemos parte.


Começo por relatar o meu imenso descontentamento pelo modo como vem sendo tratada a cultura, especialmente teatral, em Uberlândia. As formas como são pensados os incentivos, o fomento, a produção, circulação e, o mais importante a meu ver, a manutenção dos bens culturais.
Há escassez de espaços para apresentar, locais inadequados para ensaiar sem a infra-estrutura necessária e inerente à linguagem cênica, como por exemplo, a guarda de objetos e adereços das produções. A própria imprensa, contextualizada na realidade cultural presente nos resultados do Programa Municipal de Incentivo a Cultura, também reflete o pouco interesse nos processos teatrais em desenvolvimento na cidade.
Mais uma vez uma Lei que serve muito pouco a quem realmente é do ofício. Enfim, não há políticas públicas que pensem no futuro do teatro em Uberlândia.
Pergunto-me: Onde estão os projetos aprovados no ano passado? (Atenho-me a falar apenas da área na qual experiencio e vivencio há mais de oito anos a fio em Uberlândia: O TEATRO) Alguém viu? Ouviu falar? Alguém conferiu? Como são vistas as modificações de elenco, diretores, equipe técnica e até propostas estéticas na execução dos projetos? Ué pode? Tanta burocracia! Pra quê pedem currículos em anexo? A Lei nº. 9.274, de 19 de julho de 2006, e o Decreto nº. 10.467, de 07de novembro de 2006 regulamentam no item 5.2.1.:
I b) “Capacidade gestora e de realização da equipe envolvida no projeto: Entende-se como potencial de realização da equipe a capacidade do Empreendedor e dos demais profissionais envolvidos de realizar, com êxito, o projeto proposto, comprovada por intermédio dos currículos, documentos e materiais apresentados.”
São incompreensíveis as razões que norteiam o pensamento de uma Lei que deveria existir para fomentar ou alimentar a arte local. Mas o que vemos são migalhas espalhadas por todos os lados. Haverá continuidade para estes “grupos” e produções contemplados agora? Qual a vantagem de programas desse tipo? Quantidade e não qualidade, o duelo eterno do falso capitalismo, porque capitalismo de verdade prevê o melhor do que se tem para competir no mercado. Será que a representação da Comissão de Avaliação e Seleção tem faltado à aula de história? Há quantos anos a sociologia, a ciência, a filosofia, a engenharia já descobriu que é preciso construir passo a passo bases sólidas para a formação humana e também para qualquer edifício concreto!!
Atrizes, atores, diretores, gestores culturais com grupos que já têm uma trajetória, uma estrada percorrida, um público em formação, uma dignidade adquirida por meio de muita ralação, muito suor, muitos erros e acertos não estão sendo contemplados. Temos reconhecimento-ZERO da nossa secretaria de cultura. Não fazemos teatro por hobby, não estamos estagnados no tempo e nem somos iniciantes. A Comissão de Avaliação e Seleção deve compreender que este é um momento importante para a sedimentação de grupos que já têm alguma trajetória e que precisam alçar vôos para se tornarem mais autônomos no futuro.
Viajamos o país com o peito cheio de orgulho representando Uberlândia por mais de sete estados. Contamos que Uberlândia fica no Triângulo Mineiro, região privilegiada por sua localização geográfica, que tem em torno de 600.000 habitantes, contamos do que já foi nosso festival de dança e no que está se transformando nossa Mostra Nacional de Teatro. Contamos da Universidade, do curso de TEATRO já com 12 anos e um corpo docente invejável que nos traz olhares cariocas, paulista, mineiros e franceses...
Hoje me envergonho de pertencer a um grupo da cidade de Uberlândia. No qual a Lei não reconhece a lucidez de nossos e tantos outros projetos. Há necessidades para continuarmos. Sinto um esfacelamento da vontade. Ao pedir uma explicação aos responsáveis, ouvimos que somos bastante esclarecidos, e somos capazes de conseguir recursos por outras fontes e que é preciso dar oportunidade para os novos. Coitados. A maneira como estão tratando a Lei é a de quem dá esmolas e a função dela não é essa. Se for então é preciso mudar a Lei. Li e reli o edital e não há um só lugar onde isso esteja escrito. Encontrei sim: exemplaridade da ação; potencial criativo; capacidade da equipe; efeito multiplicador; perspectivas de continuidade; aperfeiçoamento; favorecer o crescimento da bagagem técnica e do repertório de conhecimentos dos artistas, gestores, produtores e agentes culturais; estimular ações; pesquisa; benefícios concretos...
É uma fraude? Proponho a CPI da Lei Municipal. Acabará em pizza? Deixe-nos ter acesso aos projetos aprovados, aos argumentos e objetivos, aos currículos. Dêem a cara à tapa! Eu estou dando.
A não ser pelo público, pra que continuar representando nessa cidade?
“Não represento mais.”
Pra quem tem essa visão de mundo não mais.

Maria De Maria*



* Formada no curso de Artes Cênicas da Universidade Federal de Uberlândia atua como atriz e produtora no grupo Trupe de Truões, atualmente em trabalhos como o infanto-juvenil "Ali Babá" e o melodrama "A Maldição do Vale Negro".

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